"Três!", disse o homem com cabeça de cão.
"Duas e nem mais uma décima", afirmou o homem com orelhas de gato.
"Isso nem vale um gato pintado", disse o homem com cauda de rato, temendo ter ofendido o homem com orelhas de gato. Era frequente o homem com cauda de rato dizer coisas inoportunas.
O negócio continuou com o homem com cabeça de cão a enaltecer as características da sua mercadoria. "Este é um magnífico instrumento que tem múltiplas funcionalidades e esculpido com recurso a uma ancestral arte de carpintaria fenícia", disse sem saber muito bem o que era a Fenícia. No entanto, se ele não sabia, muito menos saberia o homem com orelhas de gato...
Nem tinha acabado de pensar, já estava o homem com cauda de rato a dizer "O que é a Fenícia?".
"Isso não interessa, é complicado, não ias entender, é muito bom!" disse apressadamente o homem com cabeça de cão atropelando as palavras.
O homem com orelhas de gato, compreendeu que a mercadoria tinha acabado de perder valor e disse, "Uma".
"UMA?!" gritou o homem com cabeça de cão, "mas já tinhas oferecido duas, não podes baixar, isso não é regatear honestamente."
O homem com orelhas de gato, sorriu de lado, como apenas os gatenses sabem saber, e respondeu "mas tu mentiste e, por isso, acho que afinal vale ainda menos do que tinha pensado." Na realidade, o homem com orelhas de gato entendeu foi que o homem com cabeça de cão estava desesperado por vender o instrumento e que podia reduzir o preço.
O homem com cabeça de cão estava realmente desesperado... Como poderia regressar a casa sem dinheiro para o combóio? Estava nas mãos do homem com orelhas de gato. Ou talvez não... "Ó homem com com cauda de rato, quanto dás tu pelo instrumento?".
Por esta não esperava o homem com orelhas de gato. Apressou-se a protestar "o negócio é comigo! Não podes agora vender a outro."
"Posso, posso" disse o homem com cabeça de cão. "Baixaste o preço e eu acho que isto vale três, mesmo que os fenícios não lhe tenham tocado."
O homem com cauda de rato ficou surpreendido. Até tinha três no bolso e estava lisongeado por, pela primeira vez, o terem considerado. Não era normal ter peças ouro, mas o trabalhinho daquela manhã tinha corrido bem e, por isso, podia pagar.
O homem com orelhas de gato disse logo, "prontos, dou duas e meia".
Até poderia ter aceite, mas o homem com cabeça de cão estava disposto a dar uma lição ao homem com orelhas de gato. Esperou, olhou para o homem com cauda de rato e disse "Então?"
"Três!", disse o homem com cauda de rato. Nem tinha acabado de concluir aquela curta palavra e já o homem com cabeça de cão dizia "vendido!"
Foto: F Cardigos.
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